domingo, 2 de setembro de 2012

Carta - versão final

Avó,
Se te escrevemos estas palavras, é porque já não estás cá mais connosco. Fisicamente, pelo menos, pois nos nossos corações, tu estarás sempre presente. Parte do que somos hoje, devemos-te a ti. E sei que não somos os únicos. Vimos uma igreja cheia de gente para se despedir de ti que sabemos sentir o mesmo. Mudaste vidas. Educaste crianças sob os mesmos valores em que vivias. Criaste três filhas lindas e poderosas, que agora temem o amanhã sem a mãe delas. Caminhaste ao lado do avô e ajudaste-o nas suas conquistas. Amaste a Inha como se fosse tua própria filha. Mimaste os teus netos, de tal forma que eles hoje não sabem como viver sem ti. Recebeste os restantes membros da família e amigos sem qualquer julgamento. Não estivemos lá para ver. Mas sabemos disso por todos os dias que passamos juntos e porque a dor deles, neste momento, não engana. Nem nos deixaste despedir de ti. Nem te dissemos adeus, nem o quanto te amamos.
O dia em que nos despedimos de ti foi um tormento para nós. Sentimo-nos a sufocar. Querer fugir dali para fora, mas não poder. Ver tanta gente a sofrer e não poder fazer nada para aliviar essa dor, foi uma tortura. As horas pareciam intermináveis.
As memórias da nossa infância são muito vagas. Especialmente antes do acidente. Mas o acidente mudou as nossas vidas. Mudou quem nós eramos. Ficamos mais fortes, lutamos contra muitas adversidades, mas vencemos todos os obstáculos. Até agora. Este obstáculo é demasiado grande para se contornar e vamos ter que subir. Todos nós, juntos. Vamos ter que nos ajudar uns aos outros para o escalar. Mas havemos de conseguir. Sabes porquê? Porque tu nos ensinaste a lutar e a ser fortes. Foste tu que, depois daquele dia 25 de Abril, nos ensinaste a levantar e a andar, independentemente das contrariedades que aparecessem pelo caminho. Moldamo-nos às novas circunstâncias da vida e continuamos em frente. É isso que vamos fazer novamente. Mas mais devagar, pois esta dor que vive dentro de nós é demasiado grande para nos conseguirmos levantar já. Deixa-nos estar mais um bocado a chorar a tua ausência. Este vazio é tão grande e não sabemos quando vai ser preenchido.
Deixaste-nos demasiado cedo, avó. Mas estás desde já convocada para ver os teus pequenos graduados. Ver- nos ter êxito no mercado de trabalho. Ver nos casar e ver os teus bisnetos. Serás sempre a nossa estrela-guia. Não te vais descartar das tuas funções de avó.
Se estivesses aqui hoje, tenho a certeza que nos ias ralhar a todos. Sempre foste um rochedo, o nosso rochedo, e nunca fraquejaste. E nós estamos todos de luto, porque partiste. Choramos e abraçamo-nos, porque ainda não sabemos como lidar com tudo isto. Uma coisa é certa, prometemos lutar contra cada adversidade como tu nos ensinaste. Com um sorriso na cara. Raro era o dia em que te vimos sem um sorriso. Nunca te vimos triste ou a chorar.
Sei que o amanhã vai ser melhor. Temos todos que descansar para a batalha que vamos travar nos próximos tempos. Precisamos de energia para o amanhã e para os dias em que respirar vai ser um tormento. Mas vamos ficar bem, eu sei que sim. Um minuto de cada vez, um segundo de cada vez. Prometemos que vamos ser fortes. Prometemos ainda tomar bem conta do avô, das tias, da Inha, mas acima de tudo um dos outros. Já temos muitas saudades tuas.
Um rosário de beijinhos dos netos que te adoram.
Rita, Gil, João, David, Inês e Diogo


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